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Tenho uma ideia! E agora? Por Felipe Azeredo.

Tenho uma ideia! E agora? Por Felipe Azeredo.

Tenho uma ideia! E agora?

Como é sofrível ter uma ideia e não saber como torna-la realidade!

Quero compartilhar com todos uma grande dificuldade que tive ao começar a escrever e como consegui lidar com o problema: ter uma ideia que parece promissora, mas não saber por onde começar a desenvolver material.

Antes de mais nada, permitam que me apresente um pouco.

Meu caso de amor com a literatura começou por influência de minha mãe. Professora de língua portuguesa, foco em gramática, detinha em casa estantes de livros de diversas vertentes. Várias foram as vezes que a acompanhei em visitas às editoras de Goiânia em busca de livros para suas aulas e vez ou outra conseguia algum título que me chamasse a atenção.

Em uma época na qual entretenimento não era algo tão simples de se obter como hoje em dia, acabei por gastar horas da minha infância atrás de páginas amareladas de livros, descobrindo o prazer de viajar pelos mundos inventados por pessoas que às vezes nem conseguia pronunciar os nomes.

Curioso e de mente inquieta, passei logo a inventar as histórias mais absurdas para contar a todos, muitas vezes sendo eu mesmo o protagonista. Sem saber ao certo o que falava, misturava realidade e fantasia. Não preciso dizer que tornei-me um tipo de mentiroso, é claro que para a tristeza e impaciência de minha mãe que abarrotada nas obrigações diárias não tinha como compreender metade das coisas que minha mente imatura jogava contra ela.

Com a sabedoria que apenas uma amante das letras poderia ter, induziu-me a colocar as ideias no papel (hoje tenho a impressão de que ela fez isso para que eu não mais a incomodasse com minhas bobagens – ela era uma mulher terrivelmente ocupada).

É óbvio que não produzi nada realmente interessante naquela época e relendo algumas poucas páginas que ainda possuo vejo a inexperiência estampada em cada linha, mas serviu para pavimentar o caminho para um futuro amor.

Durante anos o desejo de escrever permaneceu adormecido. A juventude clamava por prazeres mais imediatos e por mais de uma década mesmo a leitura foi tratada com amplo relapso.

Apenas em algum mês que não me lembro ao certo, durante o ano de 2019, foi que uma fagulha acendeu em minha mente e negou-se a se apagar. Pode parecer clichê, mas foi a mais pura verdade. Acordei de um sonho esquisito e muito animado. Não me lembro dos detalhes, mas posso dizer a todos que foi muito interessante. Tão interessante que por três dias a lembrança da essência do sonho tornava a voltar tão nítida quanto ao acordar no primeiro dia.

Sim, eu sabia o que deveria fazer. Precisava escrever! Mas como faria isso? Não tinha a menor ideia de por onde começar, assim como certamente muitos outros escritores que acabam abandonando as letras antes mesmo de começar.

Sentei-me em frente ao computador, busquei inspiração, toquei nas teclas e nada. Simplesmente nada! As palavras não surgiam, as ideais tornavam-se um emaranhado complexo e desconexo. Depois de muito esforço e várias xícaras de café preto sem açúcar, enfim comecei a criar muito lentamente as páginas iniciais do que desejava que um dia se tornasse um livro.

Talvez a melhor imagem do que eu sentia durante a criação das primeiras páginas era que havia em minhas mãos um enorme novelo embaraçado que de alguma forma precisava desfazer os nós e criar algo que fosse digno de admiração. Eu sabia que não possuía a experiência necessária, mas mesmo assim fui em frente movido por uma força invisível. Eu precisava me livrar do tormento das ideias que não me abandonavam, e para isso deveria escrever.

Inicialmente não imaginava que minha primeira obra se tornaria o que veio a ser. Pensava em rascunhar umas duzentas páginas, mostrar para os parentes mais próximos e engavetar com aquela sensação de tapinha nas costas e dever cumprido.

Acabei fascinado pelas palavras que surgiam na tela conforme lentamente puxava os fios do novelo. Demorei mais de cem páginas para encontrar o estilo que me dava mais prazer, tanto que os dois primeiros capítulos do primeiro livro da série “a cura de todo mal” diferem bastante em estilo de todo o restante da obra.

Certo, depois de falar tudo o que foi dito acima como realmente encontrei uma forma de conseguir escrever sem sofrer tanto?

Antes de mais nada eu precisava aprender! Com isso em mente tornei-me assíduo frequentador de feiras de livros e iniciei minha biblioteca com obras de autores famosos. George Orwell, Júlio Verne, H G Wells, Aldous Huxley…

Da noite para o dia tornei-me um leitor focado.

Aqui fica minha primeira dica e talvez a mais importante: se você quer escrever deve saber ler. Quando digo saber ler, quero dizer que não é algo que seja tão simples de fazer. Qualquer pessoa minimamente alfabetizada consegue decifrar os símbolos simples do cotidiano, mas se você deseja se transformar em um escritor deverá ser capaz de absorver o que lê. Isso significa que deve ser seletivo com o que lerá, afinal isso lhe tomará tempo. Deve ser capaz de encontar o fluxo constante de leitura, interpretar o texto e conseguir não apenas copiar o estilo de determinado autor, mas sim, aprender com todos e desenvolver o estilo em que se sinta confortável. Escrever antes de mais nada deve trazer prazer e alegria, senão o que for escrito não convencerá ao futuro leitor. Se não for bom para o escritor, como será para o leitor?

E como produzir algo que seja bom?

Dou então a segunda dica.

Além de ser capaz de usar o estilo certo, o autor deve ser capaz de entregar as ideias de forma coerente. Essa era minha grande dificuldade!

Como disse, as ideias vinham como um enorme novelo com as pontas escondidas e difíceis de encontar. Eu precisava me organizar!

Comecei tentando categorizar a história, os personagens os fatos. Não foi o suficiente. Quando decidi fazer isso já tinha três capítulos escritos, cada um com subcapitulos, uma dezena de personagens e um amontoado de fatos complexos e relevantes. A história me engoliu, tornou-se um monstro com vida própria e muito maior do que eu.

Foi quando me lembrei de uma professora de literatura no ensino médio que adorava nos obrigar a fazer fichamentos. Essa era a técnica na qual me basearia para organizar minhas ideias, algo tão necessário.

Peguei um caderno velho do meu filho, uma caneta e com uma enorme xícara de café pensei um pouco. A primeira coisa que me veio à mente foi “ok, três capítulos escritos, mas o que eu quero falar agora?”

E foi assim que comecei a sistematizar o desenvolvimento do que acabaria se tornando uma série com mais de mil páginas escritas e outras obras que certamente serão criadas, pois não imagino deixar de escrever.

Então foi algo assim:

“Capítulo X – o que falar? (Escrevi uma síntese com duas ou três linhas)

Tópico A – tal personagem fará isso

Topico B – outro personagem fará aquilo

Tópico C – um determinado evento acontecerá

Agora deve criar etapas dentro dos tópicos, nada extenso, apenas uma sequência tipo passo a passo para a história.

Exemplo: o personagem encontrará uma pasta de arquivos; o personagem terá contato com determinado fato que lhe chamará a atenção; o personagem tomará tal decisão que acarretará tal coisa.”

Depois de terminado essa etapa será mais fácil desenvolver um rascunho do texto, pois mesmo que seja necessário parar durante a escrita ou que a inspiração fuja será possível reler os tópicos criados em outro momento sem correr o risco de permitir que boas ideias desapareçam após uma noite de sono.

Por último, aproveitando o que disse até agora sobre inspiração, não se deixem enganar, escrever não tem nada a ver com uma coisa mágica que surge do nada e te transforma em um grande artista.

A técnica de criar os tópicos antes de realmente escrever o material funciona, mas demanda “trabalho braçal “. Um tópico puxa o outro e logo as ideias acabam surgindo de forma coerente facilitando a redação do que deve ser considerado apenas um rascunho. Depois disso vem mais “trabalho braçal” quando todo material recém escrito deve ser revisado quantas vezes necessário até que seja finalmente aceito pelo autor. Nessa parte acho legal ter alguém de confiança acompanhando o desenvolvimento do material e que sirva como uma espécie de crítico, pois é muito fácil para o escritor se apaixonar pelo que escreve e não ver os erros que está cometendo.

A técnica de criar tópicos, desenvolver o texto a partir deles, revisar e finalmente aceitar o material produzido só funciona quando feito exclusivamente em pequenas partes. Não queiram criar toda a obra em tópico e depois desenvolver o material todo, pelo menos para mim isso não dá certo, pois durante o desenvolvimento do material acabam surgindo fatos novos que podem mudar completamente o futuro do que inicialmente havia sido pensado.

Espero que as dicas aqui compartilhadas sejam úteis aos colegas e que possam ajudar a todos que, assim como eu um dia tive uma ideia legal para escrever algo e não sabia como transformar o grande e frustrante novelo em uma obra acabada.

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