Desses servos que o sol mantém em sua órbita elíptica graças à grande lei da gravidade, alguns possuem seus próprios satélites.
Da Terra à Lua – Júlio Verne
O que consegue ser quase tão horrível quanto um conflito bélico de grandes proporções? Pessoas entediadas que são verdadeiramente apaixonadas por guerra!
Utilizando-se de tal ponto de partida para criar a primeira história da exploração espacial escrita e publicada em 1865, o fenomenal autor Júlio Verne apresenta ao leitor conceitos que, mesmo nos dias de hoje, reconheço, devem ser lidos com um glossário à mão e uma boa ferramenta de consulta à disposição.
Apresentado o leitor aos protagonistas da obra, os membros do Gun Club – veteranos da Guerra de Secessão dos Estados Unidos – o autor passa então a discorrer sobre as agonias do tédio que sentem ao verem que não há mais luta, tiros, explosões e coisas belicosas com que se preocupar. Seu ofício não é mais necessário, seus serviços podem ser deixados para segunda ordem, seus intelectos, tão afiados nas artes da artilharia, pesam com horas de ócio.
É quando o Sr. Barbicane, presidente do Gun Club, decide realizar um comunicado cercado de mistério, que faz o sangue tornar a correr nas veias dos mestres projetistas de canhões, obuses e morteiros. Um novo e audacioso projeto surge, um novo motivo para aquecerem seus cérebros prodigiosos e ao mesmo tempo, mostrar ao mundo a superioridade da arrogância americana. Eles decidem atirar na Lua com um canhão!
Neste ponto preciso relembrar o leitor de que à época que o romance foi escrito não se imaginava coisas como foguetes, ônibus espaciais, estação internacional, empresas decolando naves para levar astronautas ao espaço e trazê-los de volta em segurança. Tudo isso era um sonho distante demais e calhou ao autor, com sua inegável imaginação e capacidade para misturá-la a dados científicos, senão exatos, plausíveis, fruto de extensa pesquisa e conhecimento, pensar que a forma com que se poderia alcançar a Lua seria com os meios até então conhecidos.
Não me atreverei a replicar as tantas e quase intermináveis informações sobre mapas estrelares, seus cálculos e informações apresentadas por observatórios sérios, ou mesmo discorrer linhas e mais linhas sobre a quantidade e tipo de material necessários para construir uma enorme aberração de metal a que dão o nome de Columbiad, uma arma tão gigantesca que é possível descer dezenas de metros em seu interior por um elevador e, em certa cena, os projetistas chegam mesmo a realizar um jantar de inauguração no fundo do canhão. Sobre a história não direi mais nada para não atrapalhar a surpresa do final aos que forem lê-la, garanto apenas que de forma alguma pensei que fosse terminar como terminou.
Quantas e quantas páginas versando sobre balística, metalurgia, astronomia, química, física e outras tantas matérias tremendamente importantes e interessantes! Júlio Verne, a cada obra sua que leio, assume para mim cada vez mais um brilho de gênio, um homem que em tempos que o conhecimento formal era para pouquíssimos afortunados, fez todo o possível a seu alcance para popularizar seu riquíssimo saber, distribuindo-o por todos seus leitores e aos que, mesmo que não soubessem ler, podiam receber dos que liam, tanto conhecimento.