“O castigo que está se fechando sobre nós dois já o transformou e o esmagou”.
Edward Hyde habitava as entranhas de Henry Jekyll. Ou seria justamente ao contrário?
A leitura desta obra amplamente adaptada em tantas outras e que serviu de inspiração clara para personagens icônicos (basta pensar no Dr Bruce Banner e seu alter ego Hulk) me levou ao seguinte questionamento: o que levaria um homem bom a procurar de braços abertos entregar-se ao mal?
É justamente tal coisa que acontece ao bom e honesto Dr Jekyll. Sua queda para os estudos da química, envolvidos em certa transcendência espiritual o leva ao encontro de certa fórmula capaz de transmutar seu corpo e sua personalidade.
O ego original detém em seu íntimo desejos considerados pela sociedade e pela moral da época como indevidos e sombrios. Recolhido em seu desejo de alcançar tais desejos sem o ônus da culpa, busca em sua forma e mente deformada o caminho para obtê-los. Hyde, o odioso Hyde. Ser de pura maldade e vilania, nascido do uso da fórmula, mais monstro por suas atitudes do que propriamente por sua aparência repugnante.
A duplicidade de seres em um só corpo entra em choque, o conflito se torna inevitável, Hyde quer ser livre, anseia por viver, tomar para si tudo que Jekyll passa a negar por suas atitudes violentas. O fim inevitável acontece, o médico e o monstro estão mortos, dois sere em um só.
Daí resta outro questionamento. Quantos de nós, bons homens e mulheres honestos, cumpridores de nossos deveres, pais, mães, filhos e trabalhadores, não desejaríamos poder viver como outro ser livre para realizar nossos desejos mais obscuros e obscenos sem que o peso da culpa e da opinião recaisse sobre nós?