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Opinião literária, Admirável mundo novo – Aldous Huxley, por Felipe Azeredo

Admirável mundo novo - Aldous Huxley

Admirável mundo novo – Aldous Huxley

Qual é o preço da felicidade? Essa pergunta persiste e ecoa ao longo de toda a obra “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley. Nessa distopia perturbadora, somos levados a uma visão de uma utopia suprema, onde a felicidade é eterna e sem fim.

Nessa sociedade, nenhum indivíduo é permitido sofrer qualquer tipo de mal, seja físico ou emocional. A própria existência da alma é negada e considerada excessivamente individualista. O foco principal recai no corpo social, onde a estabilidade é a única coisa que importa. Seres humanos são produzidos em massa, em grandes instalações, e não há mais espaço para conceitos como família. Falar em pai e mãe é considerado um ato obsceno.

Nesse admirável mundo novo, todos pertencem a todos. Os pensamentos hipnopédicos são inseridos nas mentes jovens e impressionáveis durante seu condicionamento, garantindo que as castas jamais sejam questionadas. Alfas, betas, gamas, deltas e semi-aleijões ípsilons são fabricados de forma cuidadosa para ocuparem suas funções específicas, condicionados a amar seus destinos e tarefas designadas. Se for necessário um líder, um alfa-mais-mais é fabricado por meio de um processo controlado. Se forem necessários trabalhadores para as minas, dezenas de clones são produzidos através do processo de Bokanovsky, envenenados durante sua fabricação para que se tornem trabalhadores anões, estúpidos, alternando entre o calor extremo e o frio doloroso, de modo que amem o árduo trabalho a que são destinados, como se não houvesse nada mais prazeroso no mundo.

Em meio a essa sociedade perfeitamente planejada, surge a figura de John, conhecido como o selvagem. Ele nasceu do ventre de Linda, uma mulher civilizada que se perdeu em uma reserva indígena e cresceu com os costumes do mundo antigo. Para John, a honra, a glória e o sacrifício são valores morais e heroicos, conceitos considerados antiquados na visão da Londres civilizada. Ao ser trazido para esse novo mundo, ele se choca com as novas regras sociais consideradas “civilizadas” e sente repulsa por elas. Para ele, não há beleza nem verdade, apenas a felicidade infantil imposta a pessoas que jamais foram permitidas a sofrer ou pensar. Sempre que experimentam qualquer desconforto, recorrem ao soma, uma droga que oferece uma fuga prazerosa da realidade.

No decorrer da história, o selvagem, em uma conversa com o administrador, revela ao leitor a resposta para a grande pergunta: o preço da felicidade é a total perda de tudo o que nos torna humanos. Pensar e viver como indivíduos únicos, enfrentar o sofrimento e lutar por nossas próprias conquistas, superar nossos sentimentos mais complexos. Nessa sociedade, o único valor que importa é o consumo e o mais perfeito coletivismo, tudo em prol da perpetuação do corpo social.

Particularmente, também temo pelo futuro. Observo tantas pessoas vivendo apenas por viver, como seres estúpidos e alheios a questões realmente importantes, ansiando por soluções rápidas e fáceis para qualquer desconforto, como bebês de 20, 30, 40 ou 50 anos de idade! Assim como o selvagem, prefiro seguir meus dias como um eremita social, observando de longe enquanto luto para preservar minha própria humanidade.

Essa obra nos desafia a refletir sobre os valores que realmente importam em nossas vidas. A busca incessante pela felicidade a qualquer custo pode nos levar a sacrificar nossa individualidade, nossa capacidade de pensar criticamente e nossos relacionamentos humanos mais profundos. O preço da felicidade, quando perdemos de vista o que nos torna verdadeiramente humanos, é uma sociedade vazia e superficial, onde a alegria é meramente uma ilusão obtida às custas de nossa essência mais fundamental. É importante questionar os ideais impostos a nós e buscar um equilíbrio entre a felicidade pessoal e o respeito pela nossa humanidade. Em um mundo cada vez mais orientado para a busca incessante pela satisfação imediata, devemos lembrar que a verdadeira felicidade está em valorizar nossa singularidade e viver autenticamente, mesmo que isso signifique lutar contra as convenções impostas. Somente assim poderemos preservar nossa humanidade e encontrar uma felicidade verdadeiramente significativa.

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