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Como fazer uma redação de trinta linhas? – por Felipe Azeredo

Como fazer uma redação de trinta linhas? - por Felipe Azeredo

Para qualquer um que esteja se preparando para realizar uma prova de concurso, vestibular, ENEM, enfim, qualquer um desses testes grandiosos que possuem o condão de alterar significativamente a vida do candidato daquele momento em diante, o Santo Graal com toda certeza é a prova de redação, mas você sabe como fazer uma redação de trinta linhas?

Compartilhando com vocês minha experiência de vida, a vários anos prestei um concurso cuja nota era composta pelo resultado de três provas objetivas e uma discursiva. As provas objetivas se dividiam em português e matemática no primeiro dia, conhecimentos gerais (geografia, história, atualidades e coisas do tipo que agora me fogem da memória) no segundo dia somando-se à prova subjetiva que era, adivinhem, uma redação que deveria ter no máximo trinta linhas, o velho clichê das provas de concurso.

Admito amigo leitor que na juventude leviana de meus dias de escola não era um estudante tão assíduo quanto deveria. Sempre fui interessado em aprender, mas minhas técnicas (ou a falta delas) saíam dos trilhos do convencional.

Hoje vergonhosamente admito que nunca fui um grande adepto de passar horas debruçado sobre livros didáticos e cadernos para dissecar vorazmente os grandes conhecimentos generalistas do ensino médio. Interessava-me por documentários que me pareciam visualmente mais atraentes.

Lembro-me de apreciar o conteúdo compartilhado pelo saudoso Telecurso 2000 e, digo sem sombra alguma de incerteza, que as manhãs eram muito melhores em certa emissora de televisão quando exibia tal programação instrutiva seguida por boas horas de desenhos animados. Bons tempos que não voltam mais não é mesmo? Ainda é possível encontrar o material didático no endereço eletrônico www.telecurso.org.br, mas a televisão perdeu muito de sua função social sem a exibição de tal conteúdo.

Sem mais divagações, voltemos ao tema de nosso texto, a tal redação, monstrinho de sete cabeças para muitos concurseiros e vestibulandos sofridos e cheios de sonhos. Eu era um desses que buscava meu lugar ao sol. Era como um cão surdo, cego e mudo a quem resta apenas o olfato para farejar atrás de um cheiro bom sem saber realmente onde encontrar a fonte do odor.

Sobre aquela prova de concurso que falei, vamos aos resultados. A nota de matemática foi ridícula! Sem brincadeira amigo leitor, apenas por muita sorte não fui reprovado logo na primeira rodada do jogo. Era necessário atingir o resultado mínimo de 50% de aprovação nas questões e foi justamente esse resultado patético que consegui. Não me vanglorio por isso, muito pelo contrário, mas contra fatos não há argumentos.

As notas de português e conhecimentos gerais foram satisfatórias. Não posso dizer que foram realmente boas, mas garantiram que ao menos eu tivesse acesso à última prova. O concurso era daqueles que o gabarito da prova objetiva é tornado público no mesmo dia em que a prova é realizada e já destrói as esperanças logo de uma vez. Sabe como é, se não conseguiu atingir o mínimo previsto em edital, bom, então nem se dê ao trabalho de aparecer no dia seguinte pois seu nome não estará na lista de entrada. Desculpe, melhor sorte da próxima vez!

E no segundo dia lá estava eu, depois de encarar uma prova objetiva que me manteve entretido por mais da metade do tempo de realização, encarando uma folha em branco cheia de linhas intimidadoras. O tema era interessante, bom de trabalhar, daqueles que não são tão generalistas a ponto de permitir que se fale qualquer coisa, nem tão específico que cobre grandes conhecimentos especializados a quem está com a caneta na mão.

Comecei como sempre começo qualquer redação: larguei tudo e olhei pela janela.

Para alguém que esteja me observando quando faço isso, parece que abandonei as esperanças de enfrentar o problema da criação do texto, mas na verdade, estou lançando-me em um lugar calmo, longe de tudo e todos, um lugar só meu entre as folhas que balançam suaves com o vento, o azul vazio do céu claro ou simplesmente qualquer coisa que esteja lá do outro lado do vidro transparente.

Escrever é, antes de mais nada, um ato íntimo, sedutor e prazeroso. Se não for assim, meu amigo, você não está fazendo do jeito certo. Tudo que é gostoso não pode ser feito por obrigação, cheio de dor e sofrimento. “Ah, autor, você está falando bobagem. Franz Kafka escreve como se estivesse em grande tormento. Para Arthur Schopenhauer, a vida é uma alternância entre a dor e o tédio. Quem você pensa que é para falar que para escrever do jeito certo tem que ser algo bom”? Não estou dizendo nada disso amigo leitor, não se confunda.

Geralmente escrever não é algo livre de sofrimento, mas o que digo é que minimamente deve ser tratado como uma coisa que vai acrescentar algo para você e para quem lê, não apenas uma tarefa a ser terminada o mais rapidamente possível apenas por ser algo que deve ser feito. Tudo que se faz com a mentalidade medíocre de que é apenas mais uma coisa, um obstáculo que deve ser contornado, devolverá um resultado igualmente medíocre. Não perca o foco, estamos falando de uma prova que tem a capacidade de mudar a sua vida, então, resultados medíocres são inaceitáveis não é mesmo?

O fato é que fui aprovado em tal prova que permeia nossa conversa. A redação possuía peso dois. Se dependesse apenas da nota das provas objetivas jamais teria alcançado o patamar que precisava. Com um resultado impecável na prova subjetiva não apenas fiquei dentro da linha de corte, mas também dentre os aprovados que foram chamados a assumir o cargo público.

Mas como consegui tal proeza? Infiltrei-me na lendária floresta de Brocéliande para às margens do lago parlar com Viviane que a mim entregou instrumento mágico? Reuni-me com os valentes ao redor da távola para com eles me aconselhar? Subi os degraus da torre de Mérlin para diretamente com o sábio obter a visão de tudo que um dia houve, há e haverá? Nada disso amigo leitor, escrever, apesar de ser mágico, não é magia.

A verdade é que mesmo que inconscientemente à época, seguia o que posso chamar de método de estudo de redação, algo que já compartilhei oralmente com várias pessoas e, aquelas que seguiram corretamente, obtiveram resultados muito bons em suas provas.

Se você quer escrever bem, precisará se dedicar. Não falo que precise gastar horas e mais horas do seu dia em prol dessa atividade. Vamos começar pequeno e depois alcançar a grandiosidade! Brincadeiras a parte, é dessa forma que vamos fazer. Vamos lá?

Como fazer uma redação de trinta linhas?

Primeira coisa, só é possível escrever sobre o que se conhece. Já ouviu falar que você só dá o que tem? Na escrita é a mesma coisa. Eu não seria capaz de falar sobre o paradoxo do pretérito imperfeito complexo com a Teoria da Relatividade ou sobre Associação Internacional de Proteção às Borboletas do Afeganistão. Não seria capaz de falar assim de supetão, sem pesquisa, sem consulta. Infelizmente os músicos que fizeram essas duas brincadeiras com palavras já faleceram, com isso fica ainda mais difícil o processo de pesquisa sobre a real intenção sobre o tema e caso fosso importante escrever sobre essas duas coisas tão irreais teria que usar um bocado de imaginação.

Como acredito ter deixado bem claro, se deseja criar o hábito de escrever ou se precisa aprender a escrever para encarar uma prova, não adianta fazer isso com qualquer tema. Será doloroso, frustrante, difícil e extremamente reprovador. Não quero que sofra amigo leitor, então siga meu conselho, comece com calma, namore a escrita, corteje as palavras, deixe-se levar por essa viajem em tão primorosa companhia.

Tenha compromisso com você mesmo. Que tal escolher uns quinze minutos qualquer do seu dia para rabiscar algumas frases? Só isso já é um excelente começo e não vai consumir grandes materiais nem exigir enormes habilidades. Um guardanapo na mesa do restaurante durante o almoço, um pedaço de papel da embalagem do pão pela manhã, um diário escondido debaixo da cama antes de dormir. Qualquer coisa serve e ninguém precisa ficar sabendo se você quiser dar uma pitada de emoção a mais como quem está fazendo algo excitante e proibido.

Vamos lá, teste-se! Do que você gosta de falar? O que lhe dá prazer na vida? Gosta de passar horas dentro da academia? Por que não falar sobre a forma correta de se executar um levantamento supino ou uma flexão de braço no solo? Prefere jogar videogames? Que tal contar como foi que derrotou um chefe de fase que estava sendo difícil de vencer? Ou será que você só tem olhos para seus filhos pequenos? Escreva como você está se sentindo, faça um registro do que está dando certo ou errado, guarde suas lembranças enquanto estão frescas. Essa última dica tem um peso ainda maior, pois o tempo passa rápido e as lembranças não são capazes de reter as informações que o papel com sua imutabilidade consegue.

Muito bem, escolhido sobre o que falar, entra a parte de como falar. Não se preocupe muito com isso inicialmente, afinal, você não é Camões nem Descartes, e sinceramente não existe a obrigação de que seja. Você neste momento só possui um objetivo que é colocar uma palavra depois da outra de forma que alguém que leia consiga entender o que está dizendo. “Pato, bola, macaco”. Sim, você escreveu uma palavra depois da outra e quem leu consegue entender, mas você não transmitiu uma mensagem. É sobre isso que se trata uma redação: ser capaz de transmitir uma mensagem.

Então vamos lá, você acabou de rabiscar um monte de coisa em um pedaço de papel. Fez isso com suas próprias mãos, sentiu a folha ou o que quer que tenha utilizado e no canto do dedo apareceu um calo por causa do tempo que não segurava uma caneta com tanta firmeza. E agora?

Particularmente gosto de ter alguém que leia de forma crítica o que escrevi, mas se você não quiser fazer o mesmo, recomendo que digite em um programa de edição de texto atualizado o que você escreveu a mão. Lembre-se de digitar exatamente igual, sem realizar nenhuma correção. Os erros gramaticais serão realçados pelo programa e com isso você terá base sobre o que precisa ser melhorado em sua escrita. Guarde todos os textos que escrever, eles serão fundamentais para que tenha noção sobre sua evolução com o passar do tempo.

Finalmente não se esqueça de algo que vai mudar para sempre sua relação com as palavras: leia! Leia tudo, sem dó nem pudor. Se Victor Hugo te assusta, deixe-o para outra hora. As mais de mil e quinhentas páginas de Os Miseráveis é mesmo de apavorar. Fiódor Dostoiévski é um peso pesado para você? Não tem problema, ninguém quer que todo leitor seja um grande crítico social. Leia por diversão, leia por conhecimento, leia as tirinhas da Mafalda, Garfield ou Hagar o horrível, mas leia! A leitura destrava o cérebro, agrega palavras ao vocabulário, serve de exercício. Assim como qualquer parte do corpo humano, o cérebro também atrofia se não for exercitado.

Depois de todo esse exercício mental com a leitura de tantas linhas, não se preocupe amigo leitor, finalmente irei te recompensar por sua brava persistência. Listarei abaixo as quatro grandes dicas que você poderia ter ignorado todo o restante do texto e partido direto para elas, mas aí, teria perdido a oportunidade de exercitar seu cérebro com nossa conversa honesta.

1. Sobre o que eu quero falar? – Aqui entra a parte que considero principal. Usando o exemplo deste texto, quero ajudar o leitor a se tornar um bom escritor de textos curtos de até trinta linhas, então esse tema irá servir de guia para meu pensamento durante todo tempo. Lembre-se, a fuga do tema é o principal causador de baixas notas em redações.

2. Como transmitirei minha mensagem? – Isso vai depender muito da banca que está realizando o concurso, do que você sabe sobre o tema, das duas coisas juntas e principalmente, da forma com que você irá alinhar suas ideias de forma compreensível. Leia o edital para se preparar! Não se engane, comunicação não se trata apenas de fazer-se entender como alguns preguiçosos dizem por aí, é muito mais complexo do que isso. A linguagem escrita é muito mais dura com os erros. Não aceita pontuação mal utilizada, palavras com letras a mais ou faltando, coloquialidade fora de contexto e discurso raso. Tudo isso podemos guardar para as rodas de amigos, contudo, jamais para uma redação que vale aprovação.

3. A conclusão é extremamente importante! – Imaginem que um colega está falando de uma certa vez em que ele não tinha dinheiro nem para a passagem de ônibus e precisava chegar a tempo para realizar uma prova de concurso. Ele então encontra uma senhora em um ponto de ônibus, a única pessoa na rua àquela hora da manhã. Ele conta para ela o apuro e ela condoída com sua situação, lhe dá o dinheiro da passagem. Pronto, o relato da história acabou aqui. Que diacho de história é essa? O rapaz conseguiu chegar a tempo? Ele dormiu dentro do ônibus e perdeu o ponto? O que aconteceu? Vejam que a pessoa espera que o interesse e o tempo dedicado a ouvir aquela história seja recompensado. Terminar uma redação simplesmente porque acabaram as linhas disponíveis é um grande erro e possivelmente levará à reprovação.

4. Cereja do bolo! – Controle seu tempo e separe as linhas disponíveis. Para redações de prova gosto de usar a ideia do cinco. Tenha em mente que usará cinco linhas a menos do que o número máximo, isso te dará uma “gordura” para o caso de que acabe escrevendo a mais. Então, em uma redação de trinta linhas, as cinco primeiras seriam a introdução em que você passa ao leitor uma ideia sobre o que ele pode esperar do seu texto, depois quinze linhas divididas em três parágrafos em que você abordará a ideia como se desejasse convencer o leitor de que o que está dizendo é relevante e, por último, outras cinco linhas como conclusão onde o leitor deverá ser convidado a uma reflexão sobre o que foi dito. Opa, quase me esqueci – não se esqueça do título caso sua prova exija que ele exista!

Vou citar aqui uma frase que considero perfeita: Obsessão ganha do talento todas as vezes. Essa frase foi dita pelo personagem de Adam Sandler no filme Arremessando Alto, de 2022, do diretor Jeremiah Zagar.

Se você quer resultados, terá que lutar por eles. Não espere que ninguém faça qualquer coisa por você, esse é o caminho reto e direto para o fracasso. Seja você o colossal motor que promove a mudança em sua via. Você é a pessoa mais importante para você mesmo, então seja obcecado por tudo que lhe é importante, lute por seus sonhos com a mesma ferocidade que um meteoro atravessa a atmosfera terrestre. Você irá enfrentar dificuldades, irá sofrer, se desgastar, pensar que não irá conseguir, mas quando atingir seu objetivo verá como todo seu esforço se transformará em algo grandioso.

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